Por muito extraordinário que pareça, a última vez que sobre ele escrevi foi -aqui, neste mesmo blogue- no dia da sua morte, sem que soubesse da triste nova. Remonta a 2012, este meu penúltimo texto sobre Bobby Womack, cantor soul norte-americano (e autor do primeiro êxito dos Rolling Stones) falecido em 27 de Junho de 2014:
BOBBY WOMACK: The Bravest
Man In the Universe
Nenhum exagero no título. James Brown
ficou como the hardest working man in the
show-business, graças a uma produção demencial (até uma paragem do
autocarro -a meio de exaustivas digressões- era pretexto para uma ‘visitinha’
ao estúdio local). Agora, e antes que se faça tarde, convém notar como o autor
do primeiro êxito dos Rolling Stones (‘It’s All Over Now’, 1964) já vai no 27º
álbum, sem que alguma vez tenha feito a menor concessão. Na verdade, se James
Brown teve que sentir na pele o melindre da desqualificação implícita na
passagem de soul brother no.1 para sold brother no.1 nos conturbados dias
de Nixon/Watergate, o mais célebre membro do clã Womack começou por avaliar a
temperatura da alma num trivial “Fly Me To The Moon” (1968) e logo se decidiu
por um mergulho sem regresso até às regiões mais recônditas da condição humana
em “My Prescription” (1969) e “Communication” (1971). Já nada de condenável
teria feito para manchar tão nobre imagem se o novo disco respeitasse o
padrão-médio de interesse estético de (outro) meio-século de carreira. Mas que
regresse mediante uma manifestação mais moderna, fresca e urgente que o facto
comum da nata neo-soul, que as linhas
com que se cose sugiram a base de uma radical versão ‘nortista’ da mesma
redescoberta da necessidade de introspecção da Gal Costa de “Recanto” e que
seja este o momento mais arrojado de uma empolgante escrita criativa que não
atingia ‘tais alturas’ desde o duplo prodígio “The Poet/The Poet II” (1981/84),
eis o conjunto de circunstâncias onde recolhe pleno sentido o título deste
primeiro álbum em doze anos. É certo que tudo foi escrito por Damon Albarn; mas
não o é menos que Womack é o exemplo perfeito de que como o intérprete é o
genuíno autor da canção soul.
Ricardo Saló
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