Não acontece, apenas, aos diamantes. Há cerejas que também são para sempre. Não acusam a passagem do tempo. E não precisam de sujeitar-se a processos de cristalização. Não teve um começo fácil, quando a indesejável viuvez lhe trouxe a libertação da sua tão singular quanto infinita energia criativa. Teve que suportar a irascibilidade de uma ortodoxia que não (ou)via na sua música senão uma forma oblíqua de tirar partido do apelido Coltrane -no essencial, a mesma 'galeria de figuras de cera' que havia declarado Miles finado para o jazz e rendido à perspectiva de uma 'sinistra' carreira comercial, baseando-se o 'sábio' veredicto no indisfarçável interesse do 'man with the horn' pela guitarra eléctrica, pela 'cultura de rua' como estímulo estético e -'the horror'- pelo recurso ao estúdio de gravação para o inconfessável propósito de 'adulteração' do jazz-'natureza morta'. Mas os cães ladram e a caravana de sonhos passa. Depois do registo de uma mão-cheia de exercícios geniais de jazz pós-free em diálogo íntimo com os frutos de um reconhecido ADN indiano, Alice decidiu contrariar (por razões, estritamente, interiores) o sentido da história. Ou seja: enquanto a música soul nascera da integração do sagrado no mundano, a virtuosa harpista achou que já tinha a sua dose de mundo e -pelo fim dos anos 70- decidiu dedicar-se à devoção num 'vedantic center' situado nas montanhas de Santa Mónica (imediações de Los Angeles). Pensava-se que, para a briosa viajante espiritual de "Journey In Satchidananda", a música tinha chegado ao fim. E eis senão quando... O prodigioso conteúdo de umas quantas cassetes -originalmente de circulação restrita no meio conventual- dá à costa sob a forma de CD. De cortar a respiração.
Lema
40 Anos a Desfazer Opinião
quarta-feira, 30 de julho de 2014
A Cereja No Topo 5
Alice Coltrane- Turiyasangitananda: Divine Songs
Não acontece, apenas, aos diamantes. Há cerejas que também são para sempre. Não acusam a passagem do tempo. E não precisam de sujeitar-se a processos de cristalização. Não teve um começo fácil, quando a indesejável viuvez lhe trouxe a libertação da sua tão singular quanto infinita energia criativa. Teve que suportar a irascibilidade de uma ortodoxia que não (ou)via na sua música senão uma forma oblíqua de tirar partido do apelido Coltrane -no essencial, a mesma 'galeria de figuras de cera' que havia declarado Miles finado para o jazz e rendido à perspectiva de uma 'sinistra' carreira comercial, baseando-se o 'sábio' veredicto no indisfarçável interesse do 'man with the horn' pela guitarra eléctrica, pela 'cultura de rua' como estímulo estético e -'the horror'- pelo recurso ao estúdio de gravação para o inconfessável propósito de 'adulteração' do jazz-'natureza morta'. Mas os cães ladram e a caravana de sonhos passa. Depois do registo de uma mão-cheia de exercícios geniais de jazz pós-free em diálogo íntimo com os frutos de um reconhecido ADN indiano, Alice decidiu contrariar (por razões, estritamente, interiores) o sentido da história. Ou seja: enquanto a música soul nascera da integração do sagrado no mundano, a virtuosa harpista achou que já tinha a sua dose de mundo e -pelo fim dos anos 70- decidiu dedicar-se à devoção num 'vedantic center' situado nas montanhas de Santa Mónica (imediações de Los Angeles). Pensava-se que, para a briosa viajante espiritual de "Journey In Satchidananda", a música tinha chegado ao fim. E eis senão quando... O prodigioso conteúdo de umas quantas cassetes -originalmente de circulação restrita no meio conventual- dá à costa sob a forma de CD. De cortar a respiração.
Não acontece, apenas, aos diamantes. Há cerejas que também são para sempre. Não acusam a passagem do tempo. E não precisam de sujeitar-se a processos de cristalização. Não teve um começo fácil, quando a indesejável viuvez lhe trouxe a libertação da sua tão singular quanto infinita energia criativa. Teve que suportar a irascibilidade de uma ortodoxia que não (ou)via na sua música senão uma forma oblíqua de tirar partido do apelido Coltrane -no essencial, a mesma 'galeria de figuras de cera' que havia declarado Miles finado para o jazz e rendido à perspectiva de uma 'sinistra' carreira comercial, baseando-se o 'sábio' veredicto no indisfarçável interesse do 'man with the horn' pela guitarra eléctrica, pela 'cultura de rua' como estímulo estético e -'the horror'- pelo recurso ao estúdio de gravação para o inconfessável propósito de 'adulteração' do jazz-'natureza morta'. Mas os cães ladram e a caravana de sonhos passa. Depois do registo de uma mão-cheia de exercícios geniais de jazz pós-free em diálogo íntimo com os frutos de um reconhecido ADN indiano, Alice decidiu contrariar (por razões, estritamente, interiores) o sentido da história. Ou seja: enquanto a música soul nascera da integração do sagrado no mundano, a virtuosa harpista achou que já tinha a sua dose de mundo e -pelo fim dos anos 70- decidiu dedicar-se à devoção num 'vedantic center' situado nas montanhas de Santa Mónica (imediações de Los Angeles). Pensava-se que, para a briosa viajante espiritual de "Journey In Satchidananda", a música tinha chegado ao fim. E eis senão quando... O prodigioso conteúdo de umas quantas cassetes -originalmente de circulação restrita no meio conventual- dá à costa sob a forma de CD. De cortar a respiração.
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Aaah, isto é uma maravilha! Dela, só conhecia o "Journey In Satchidananda" (que tenho) e uma ou outra peça de outros álbuns. Obrigado. Vou à descoberta do resto do disco.
ResponderEliminarQuase tudo dela -especialmente na Impulse- vale a pena. Por favor, não falhe o "Ptah The El Daoud", também de 1970. Vai ficar maravilhado. E, depois, continue pela década de 70 fora. Não se vai arrepender. Um abraço
ResponderEliminarDe cortar a respiração mesmo!Não estou a conseguir encontrar o disco à venda.
ResponderEliminarNa discografia da Alice Coltrane vale muito a pena ouvir “The Elements” de Joe Henderson e “Illuminations” de Alice com Carlos Santana ( Bill Laswell, uns bons anos depois, reconstruiu o disco – comprei-o depois de ler a critica do Ricardo Saló – retirando os excessos de guitarra…).
Manuel Carvalho
Caro Manuel: este disco constitui um caso, deveras, singular. Ele está à venda na loja on-line da Soul Jazz/Universal Sound, mas por um preço nada simpático. Por outro lado, como se de um excusivo se tratasse, não aparece em mais lado nenhum à venda!... Mistério... E uma boa pergunta a fazer aos representantes da editora em Portugal. Um abraço
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